Nesta segunda-feira (28), o jornal O Estado de S. Paulo publicou, na coluna Direto da Fonte, entrevista contraditória com um ex-secretário de segurança pública de outro estado (Rio de Janeiro), que também envereda pela seara da antropologia e da ciência política, sob o título “a solução é desmilitarizar as PMs e permitir que a polícia investigue”.
Contraditória porque oferece destaque de uma página inteira para uma realidade parcial, trazendo para o título a maior das incoerências apresentadas, ou seja, a “desmilitarização” da PM como solução para um problema por demais complexo. Ainda, em momento algum da entrevista foram apresentados motivos para que Polícia Militar deixe de existir, como chegou a defender o entrevistado.
São indicados números e dados representativos da deficiência policial investigativa. Segundo o entrevistado, (1) 92% de homicídios ficam impunes; (2) os crimes mais graves não são investigados; (3) a Polícia Militar está proibida de investigar; (4) “os crimes passíveis de prisão em flagrante nem sempre são os que deveriam ser prioritários” (SIC); (5) deixam de ser investigados crimes mais graves porque o modelo constitucional define que a polícia ostensiva é proibida de investigar.
Apesar de incongruências, como demonstraremos, o entrevistado parece ter percebido algumas das causas do problema de segurança pública que a sociedade enfrenta. Contudo, peca seriamente nas conclusões.
De fato, como bem apresenta o texto publicado, é preciso rever o modelo policial brasileiro e dar às polícias ostensivas a parcial capacidade de investigação, agilizando o processo criminal e, com isso, reduzir a impunidade como acontece nas principais polícias do mundo (ciclo completo de polícia). Acerta, também, o ex-secretário ao indicar que a unificação das polícias é insustentável. Na verdade, a questão não é a insustentabilidade da unificação, mas a desnecessidade dela. O problema está longe de ser a coexistência de duas instituições policiais diferentes, mas a adoção, por parte de cada uma delas, de modelos diferentes, de ciclo incompleto.
O resultado geral da entrevista demonstra falta de coerência na apresentação da proposta: “que haja a desmilitarização e ciclo completo”. Se o ciclo completo é, de fato, fundamental, não se pode simplificar algo como a segurança pública reduzindo-a ao aspecto da investidura militar. Aliás, em nenhum momento o entrevistado prova e sequer aponta o que está errado na investidura militar, quando a maior parte das melhores polícias do mundo adota o modelo militar, como na França, Portugal, Espanha, Itália, Canadá e Chile.
Veja a incoerência: o entrevistado aponta problema na “investigação” e sugere modificar a “polícia ostensiva”, tirando-lhe a investidura militar... É tão absurdo como uma pessoa doente pedir que alguém tome remédio em seu lugar e esperar uma cura. As milhares de prisões realizadas pela Polícia Militar provam justamente o contrário do que o ex-secretário sugere, ou seja, existe uma polícia eficiente, que funciona e que cumpre rigorosamente as leis. Se for necessário mudar algo, talvez seja justamente as leis, mas não quem de fato as fazem cumprir. É querer resolver drasticamente um problema, sem buscar a essência na solução e, como na expressão popular, jogar fora o bebê na bacia junto com a água suja do banho.
O que mais chama a atenção, contudo, não é a linha adotada pelo entrevistado, mas o fato de o jornal dar um espaço tão grande para um posicionamento distante da realidade do leitor. Todas as afirmações utilizadas se referem à experiência do ex-secretário em apenas um dos estados da federação, o que, de início, torna inválidas as generalizações que faz. Ele afirma, por exemplo, que as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) “estão falidas”; contudo, é importante ressaltar que esse modelo não é adotado na maioria dos outros estados (São Paulo, por exemplo, tem um programa de policiamento comunitário que é referência no País e fora dele). Outro exemplo contrastante diz respeito aos homicídios dolosos: se todo Brasil tivesse as mesmas políticas de segurança pública adotadas em São Paulo, e muito bem sucedidas, cuja linha de frente é exatamente a Polícia Militar, em tese poderia alcançar a mesma taxa de 8,8 homicídios por 100 mil habitantes, façanha que permitiria ao País limitar a pouco mais de 17 mil mortes por ano (cálculo com base na população, Censo 2013), muito aquém das 56 mil mortes violentas anualmente registradas!
CENTRO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL DA POLÍCIA MILITAR DE SÃO PAULO (CComSoc)
Adilson Luís Franco Nassaro, Coronel PM Chefe do CComSoc, São Paulo/SP
Contraditória porque oferece destaque de uma página inteira para uma realidade parcial, trazendo para o título a maior das incoerências apresentadas, ou seja, a “desmilitarização” da PM como solução para um problema por demais complexo. Ainda, em momento algum da entrevista foram apresentados motivos para que Polícia Militar deixe de existir, como chegou a defender o entrevistado.
São indicados números e dados representativos da deficiência policial investigativa. Segundo o entrevistado, (1) 92% de homicídios ficam impunes; (2) os crimes mais graves não são investigados; (3) a Polícia Militar está proibida de investigar; (4) “os crimes passíveis de prisão em flagrante nem sempre são os que deveriam ser prioritários” (SIC); (5) deixam de ser investigados crimes mais graves porque o modelo constitucional define que a polícia ostensiva é proibida de investigar.
Apesar de incongruências, como demonstraremos, o entrevistado parece ter percebido algumas das causas do problema de segurança pública que a sociedade enfrenta. Contudo, peca seriamente nas conclusões.
De fato, como bem apresenta o texto publicado, é preciso rever o modelo policial brasileiro e dar às polícias ostensivas a parcial capacidade de investigação, agilizando o processo criminal e, com isso, reduzir a impunidade como acontece nas principais polícias do mundo (ciclo completo de polícia). Acerta, também, o ex-secretário ao indicar que a unificação das polícias é insustentável. Na verdade, a questão não é a insustentabilidade da unificação, mas a desnecessidade dela. O problema está longe de ser a coexistência de duas instituições policiais diferentes, mas a adoção, por parte de cada uma delas, de modelos diferentes, de ciclo incompleto.
O resultado geral da entrevista demonstra falta de coerência na apresentação da proposta: “que haja a desmilitarização e ciclo completo”. Se o ciclo completo é, de fato, fundamental, não se pode simplificar algo como a segurança pública reduzindo-a ao aspecto da investidura militar. Aliás, em nenhum momento o entrevistado prova e sequer aponta o que está errado na investidura militar, quando a maior parte das melhores polícias do mundo adota o modelo militar, como na França, Portugal, Espanha, Itália, Canadá e Chile.
Veja a incoerência: o entrevistado aponta problema na “investigação” e sugere modificar a “polícia ostensiva”, tirando-lhe a investidura militar... É tão absurdo como uma pessoa doente pedir que alguém tome remédio em seu lugar e esperar uma cura. As milhares de prisões realizadas pela Polícia Militar provam justamente o contrário do que o ex-secretário sugere, ou seja, existe uma polícia eficiente, que funciona e que cumpre rigorosamente as leis. Se for necessário mudar algo, talvez seja justamente as leis, mas não quem de fato as fazem cumprir. É querer resolver drasticamente um problema, sem buscar a essência na solução e, como na expressão popular, jogar fora o bebê na bacia junto com a água suja do banho.
O que mais chama a atenção, contudo, não é a linha adotada pelo entrevistado, mas o fato de o jornal dar um espaço tão grande para um posicionamento distante da realidade do leitor. Todas as afirmações utilizadas se referem à experiência do ex-secretário em apenas um dos estados da federação, o que, de início, torna inválidas as generalizações que faz. Ele afirma, por exemplo, que as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) “estão falidas”; contudo, é importante ressaltar que esse modelo não é adotado na maioria dos outros estados (São Paulo, por exemplo, tem um programa de policiamento comunitário que é referência no País e fora dele). Outro exemplo contrastante diz respeito aos homicídios dolosos: se todo Brasil tivesse as mesmas políticas de segurança pública adotadas em São Paulo, e muito bem sucedidas, cuja linha de frente é exatamente a Polícia Militar, em tese poderia alcançar a mesma taxa de 8,8 homicídios por 100 mil habitantes, façanha que permitiria ao País limitar a pouco mais de 17 mil mortes por ano (cálculo com base na população, Censo 2013), muito aquém das 56 mil mortes violentas anualmente registradas!
CENTRO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL DA POLÍCIA MILITAR DE SÃO PAULO (CComSoc)
Adilson Luís Franco Nassaro, Coronel PM Chefe do CComSoc, São Paulo/SP
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