O Comando de Policiamento do Interior 4 (CPI-4), Bauru/SP, promoveu na quarta-feira, 01/10/2014, debate na Instituição Toledo de Ensino (ITE), intitulada "Direitos Humanos e a Polícia do Futuro". A iniciativa faz parte de um ciclo de discussões realizado pela Polícia Militar em âmbito estadual.
Em Bauru, duas mesas compuseram os debates. A primeira, nomeada "Há necessidade da atuação da Polícia Militar em manifestações sociais?", abordou aspectos da participação policial em protestos populares e a finalidade das forças policiais nessas situações.
Participaram dessa mesa, o prof. Dr. Clodoaldo Meneguello Cardoso, do Observatório de Educação em Direitos Humanos da Unesp/Bauru e o Tenente-Coronel PM Adilson Luís Franco Nassaro. A mesa teve como mediador o Coronel PM Elizeu Eclair Teixeira Borges.
Em Bauru, duas mesas compuseram os debates. A primeira, nomeada "Há necessidade da atuação da Polícia Militar em manifestações sociais?", abordou aspectos da participação policial em protestos populares e a finalidade das forças policiais nessas situações.
Participaram dessa mesa, o prof. Dr. Clodoaldo Meneguello Cardoso, do Observatório de Educação em Direitos Humanos da Unesp/Bauru e o Tenente-Coronel PM Adilson Luís Franco Nassaro. A mesa teve como mediador o Coronel PM Elizeu Eclair Teixeira Borges.
Segue a fala do Tenente-Coronel PM Franco Nassaro:
Bom dia, senhores integrantes da mesa. Comandante,
Coronel PM Airton Iosimo Martinez, na pessoa de quem cumprimento todos os
companheiros policiais militares e acadêmicos aqui presentes, comunidade em
geral. Trata-se de uma grande oportunidade de diálogo, buscando aperfeiçoamento
do nosso trabalho. Isso é prova de maturidade da Força Pública paulista, é demonstração inequívoca
de interesse no aperfeiçoamento intelectual e é uma prova de que estamos
inseridos em um contexto democrático.
Professor
Clodoaldo, com ou sem óculos, é muito bom viver em uma democracia!
Selecionei
vários pontos interessantes e, pelo limite do tempo, naturalmente, pretendo
publicar essas reflexões em artigo que será devidamente divulgado. Vou
aproveitar essa oportunidade para transmitir os pontos principais, em nome da
Polícia Militar, em nome do nosso esforço de aprimoramento profissional, a fim
de poder provocar, na segunda etapa, o momento mais importante, que são os
debates.
Eu
começo citando Herman Goldstein, em obra de 2003 (Policiando
uma Sociedade Livre), em
que registrou uma frase emblemática, tratando de democracia e polícia: “As
atividades policiais e o convívio democrático são indissociáveis”.
Não existe
democracia sem polícia; aliás, o próprio Estado, como nós o conhecemos, surgiu
e se caracterizou pelo provimento da segurança, pela composição de uma força
policial que pudesse garantir uma mínima convivência pacífica entre as pessoas,
seja qualquer o nome que queiram atribuir a esse órgão.
Este diálogo é muito interessante pela formação
do nosso professor convidado, que vem da área da filosofia e da educação, e a
minha formação, como da maior parte dos policiais militares, é uma formação
mista, concentrando ensinamentos da vivência e dos procedimentos policiais e
conceitos jurídicos, e muitos de nós, como eu, acabamos nos especializando na
área jurídica, e por um interesse particular, também, na área de História.
Então nosso enfoque, nosso óculos também estão calibrados para uma visão que
possa somar neste diálogo.
Não
somente a democracia depende da força policial, do papel exercido pela polícia,
mas, também, o vigor dessa democracia e a qualidade de vida dos cidadãos
depende da eficiência do órgão policial. Chegamos neste ponto a um direito
fundamental, pouco explorado até agora, que é o “direito a segurança”. Nós o encontramos
tanto na Declaração de 1789, quanto na Declaração de 1948 cujo aniversário de
70 anos estamos prestes a comemorar. Também
encontramos dispositivo específico, repetido em nossa Constituição
Federal , assegurando o direito à segurança. Isso muito nos
interesse, porque a segurança, além de um direito fundamental, igualmente
constitui um direito instrumental para a garantia de todos os demais direitos:
a liberdade, o direito a propriedade, o direito de manifestação e o direito de
reunião em público, e tantos outros direitos individuais consagrados na nossa
Constituição Federal, de 1988, na condição de direitos fundamentais: os
direitos individuais e coletivos previstos no Artigo 5°. O próprio preâmbulo da
Constituição Federal já trás como um direito fundamental, fundante do próprio Estado
de direito, do Estado Brasileiro, a segurança pública.
Vamos nos lembrar, agora, sob um ponto de vista
existencialista, a necessidade que o ser humano traz de preencher alguns
quesitos básicos para a sua existência. Todos se lembram das lições de Maslow,
que observou as cinco necessidades naturais. A primeira delas é fisiológica, a
segunda é a necessidade de segurança, a de participação, de estima e de autorealização;
elas se encontram em uma ordem hierárquica. Nós precisamos de segurança para
satisfazer todas as demais necessidades, e ouso dizer, inclusive as
fisiológicas.
Em razão
das limitações do homem, que não consegue viver sozinho, na condição de um ser
gregário por natureza como observou Aristóteles, um ser social na sua essência,
se agrupou e buscou preencher as suas necessidades em coletividade, em um
processo natural. Não vou detalhar toda evolução humana, como é vontade de um
historiador – esse um erro pelo vício da origem, o que prejudicará a todos,
naturalmente, porque não haverá tempo suficiente - mas vamos chegar ao Estado
Moderno, caracterizado conforme José Murilo de Carvalho, citando Max Weber, por quatro itens, a burocracia, o
poder judiciário independente e estruturado, uma força policial que dê
sustentação a essa ordem e, quarto, uma arrecadação em tributo, porque tudo
custa, e o Estado também tem as suas despesas.
Portanto,
o Estado Moderno, com essa característica, apresenta uma força policial, tanto
na perspectiva do Estado Absoluto, de Thomas Hobbes, quanto no Estado Liberal, de
John Locke. Também lembramos um terceiro contratualista, Jacques Rousseau,
colocando a vontade geral de forma suprema, sendo esta capaz, inclusive, de destituir
o poder por ela mesmo, defini-lo conforme
leis, regras, que possam dar o devido ordenamento à sociedade organizada. Todas
as manifestações do Estado, portanto, dependem de uma força policial que possa
prover segurança, também como uma capacidade instrumental que permita a fruição
dos demais direitos.
A
segurança, aliás, se manifesta no modo individual ou coletivo. Nosso saudoso
mestre, Álvaro Lazzarini, registrou que “o Estado deve ter sua polícia, a sua
força pública, que não cogitará tão só da sua segurança ou a segurança da
comunidade como um todo, mas, sim, e de modo especial, da proteção e da
garantia de cada pessoa, abrangendo o que se denomina de segurança pública, no
sentido coletivo e no sentido individual da proteção do Estado”.
Temos
duas percepções de segurança, a segurança individual, enquanto integrantes de
uma sociedade, enquanto indivíduo, e uma segurança coletiva, o que nós,
estudiosos da segurança pública, determinamos como o “sentimento de segurança”,
ou “percepção de segurança”. Fundamental essa percepção de segurança, coletiva
ou individual, para que possa existir também o exercício das manifestações públicas,
ou populares como alguns preferem chamá-las.
Observo,
também, o que os estudantes de direto não encontrarão nos manuais, nem na área
do direito administrativo, como uma construção recente: defendo a existência de
duas grandes redomas de proteção da sociedade. Existe uma camada de proteção
mais próxima, que nós chamamos de “tutela policial”, e uma outra grande redoma,
a tutela judicial, que cobre e, inclusive, também protege a tutela policial.
Temos,
dentro do exercício da tutela policial, um instituto com que poucos de nós,
inclusive, gestores de segurança pública, nos preocupamos, que é o chamado “mandato
policial”. Reflitam comigo. Existe a figura do juiz natural, o competente para
decisões na sua esfera de atribuições, mas também existe, na estrutura
policial, nos cinco órgãos policiais estabelecidos na Constituição Federal,
Artigo 144 - cada qual com a sua competência - os “mandatos policiais”; existem
áreas de circunscrição, competências específicas e anseios da população para
serem correspondidos.
Chegaremos, certamente, no debate, ao ponto
crucial da questão: “Qual a necessidade da presença da força policial nas
manifestações?”, mas já antecipo a resposta, no sentido de que a Polícia
Militar, que é uma força constitucional, de defesa do Estado e das instituições
democráticas, não só pode, como deve atuar no seu papel de policiamento
preventivo.
Uma vez cuidando da preservação da ordem
pública, mediante o exercício da polícia ostensiva, não só pode como deve atuar,
para garantir o direito da segurança, que é um direito fundamental, como o
próprio direito de manifestação, a liberdade, a incolumidade das pessoas na sua
integridade física, na sua dignidade como pessoa humana, o patrimônio publico e
privado e todos os demais direitos e garantias que, também, a Constituição
Federal defende e prescreve.
Esse mandato policial, no caso da Polícia
Militar, é exercido mediante a expressão do poder de polícia. Poder de polícia
não é algo etéreo, não é uma simples construção doutrinária, ele é uma
ferramenta. Estudiosos na França começaram a desenvolver esse conceito e no
Brasil, Doutor Álvaro Lazzarini se aprofundou e se consagrou como grande
estudioso do poder de polícia, com nome internacionalmente reconhecido. O
mestre citava a lição de José Crelella Júnior sobre o poder de polícia que “não
tem aquele que quer, mas aquele que pode”, aquele a quem é concedido o mandato
policial. E a ordem pública, naturalmente sobre o ponto de vista existencial, é
condição para termos uma vida em sociedade equilibrada, que, aliás, é o
fundamento da construção do Estado, e o Estado existe para o bem comum.
Parte integrante do Estado é a força policial
que, então, proverá segurança, que dará condições para que a sociedade possa se
desenvolver com paz. Paz que é sinônimo de civilidade, de uma sociedade que
busca uma convivência pacífica. Mas o que é a ordem publica? Ordem pública,
cuja preservação compete a Polícia Militar, é um estado antidelitual, diz mais
uma vez Lazzarini, caracterizado pela observância dos preceitos tutelados pelos
códigos penais comuns e pelas leis das contravenções penais.
Ainda, senhores, a ação da Polícia Militar
engloba uma série de práticas além daquelas dirigidas ao combate direto e
imediato ao crime, tratando de vários tipos de problemas humanos, dificuldades,
anseios, expectativas, canalizadas quase sempre para o nosso telefone 190, o
telefone de emergência. E a Polícia Militar também atua nas áreas de tranquilidade
e de salubridade pública que, juntamente com a segurança pública, compõem as
esferas da ordem pública, na lição trazida dos estudiosos franceses, ainda no
século XX.
Esse
poder de polícia tem três atributos básicos – recordando-nos das aulas de
direito administrativo - a discricionariedade,
a autoexecutoriedade e a coercitividade, ou seja, o policial
pode escolher o melhor momento de agir, ele autoexecuta sua missão, ele não
depende de ordem judicial, ou seja, a esfera da tutela policial (que não só
prevê o aspecto de proteção) trata também do controle do cumprimento da lei,
não depende de ordem judicial, constitui atuação imediata. Assim, o policial é
o juiz do fato, ele lida com a realidade, não com uma reconstrução da realidade,
como exerce o juiz, e como participam desse processo os demais atores da Justiça.
E o terceiro atributo do poder de polícia, como ato administrativo, é a
coercitividade; somente a força policial legítima, constituída, que age em nome
do Estado, em defesa da sociedade, como condição para o equilíbrio e para a
harmonia da convivência das pessoas, somente ela pode usar a força para fazer
cumprir a lei. Aliás, a própria ONU identifica os agentes, integrantes de
forças policiais legalmente constituídas de “law enforcements”, ou aqueles que fazem cumprir a lei,
com sua obrigação de agir de tal forma sempre em defesa da sociedade e que, por
isso, exercem poderes especiais.
Além
de um poder, os estudiosos do direito administrativo, no capítulo especial do
poder de polícia, chamam essa capacidade instrumental dos agentes do Estado - com
competência para tanto - de poder-dever. Temos, muito além da possibilidade, o dever de agir em defesa da sociedade.
Superada a análise do desenvolvimento histórico do direito a segurança e também
da análise do poder de polícia, da legitimidade da ação policial, chegamos a um
ponto crucial da questão: entre o público e o privado, ou melhor, entre o
público e o particular, surge a necessidade de equilíbrio e de harmonização de
direitos.
Nosso
comandante, Coronel PM Eclair, abriu a mesa de trabalhos citando o artigo 29 da
Declaração de 1948, em que os legisladores (podemos assim chamá-los), apesar da
carga de princípios que citaram, ao final já detectaram que os direitos são
relativos, essa é a grande verdade. Não existem direitos absolutos, mesmo os
direitos fundamentais. Na concepção destes direitos individuais, como status de
direito fundamental, temos o chamado núcleo duro, e esse núcleo duro é
intocável: são direitos individuais inerentes à própria personalidade da pessoa
humana e ninguém pode avançar sobre esse núcleo duro; todavia, existe ao redor
desse núcleo o contorno, de forma circular, dos direitos individuais. Em uma
manifestação pública, num mesmo cenário, encontramos o direito a liberdade, o
direito de locomoção, o direito a propriedade, vários deles estabelecidos, todos
colocados no mesmo tempo e espaço.
Observamos, em conversa preliminar com alguns
companheiros, que as relações entre as pessoas se dão normalmente em uma
relação vertical (o antropólogo DaMatta explica isso quando estuda o direito ao
trânsito nas relações entre as pessoas). E é impossível uma relação justa nessa
condição, porque se todos buscam uma relação vertical - no trânsito torna-se muito
evidente - haverá impasse e a supressão de direitos sem que exista uma
harmonização. Precisamos buscar na convivência social uma relação horizontal,
uma relação que não impõe subordinação, mas respeito. Por meio disso, torna-se
possível a busca de equilíbrio, paz e harmonia na relação entre as pessoas e em
uma manifestação pública tal se apresenta de forma muito clara.
É verdade que no exercício das missões
específicas, na responsabilidade constitucional da nossa Instituição, o
policial pratica atos que restringem liberdades individuais na esfera
administrativa de ação do poder público. Tal consequência do pacto, o mesmo
contrato social que torna todos iguais e integrantes da mesma sociedade,
subordinados a mesma lei e à mesma ordem, impõe-se como realidade no trabalho
dos agentes de qualquer força policial devidamente organizada no mundo.
Considerando as garantias individuais que
representam, também, uma limitação do poder do próprio Estado (essa é a origem
dos direitos individuais consagrados), o agente da lei pode avançar, mas até
certo ponto. O Estado também se subordina às leis e tal é o fundamento
histórico das constituições. Posso acrescentar que deve ocorrer naturalmente
que alguns direitos individuais cedam espaço ao interesse maior da sociedade,
no limite do que seja necessário e razoável para a realização do bem comum, para
o que é a finalidade do nosso Estado.
Portanto, senhores, trata-se de uma missão
muito difícil. Talvez não exista profissão cujo exercício impõe tantos desafios
como ser policial ou como ser professor. As duas atividades, por sinal, possuem
muitos pontos em comum: lidamos com pessoas, lidamos com expectativas, temos
nessa relação muito inconformismo, muita incompreensão, muita intolerância, no
sentido negativo da expressão, e até uma certa revolta, latente ou não.
Esse desafio, senhores, trata-se exatamente de
equilibrar e garantir direitos individuais de mesmo nível e dignidade constitucional.
Não existe um superior ao outro, não existe um mais importante que o outro, em
que pese, defendemos, o direito à segurança ser estruturante, instrumental, anterior,
necessário para fruição dos demais direitos individuais. É este o sentido do artigo
28 da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, de 1948, quando
estabelece o alcance dos direitos do homem, que “estão limitados pelos direitos
do próximo, pela segurança de todos e a segurança coletiva, e pelas justas
exigências do bem estar geral e do desenvolvimento democrático”. E lembro ainda
o Artigo 29 da Declaração de 1948, que o nosso comandante e mediador já citou,
também como condição de fruição dos direitos individuais que não são absolutos.
Quero registrar nesse ponto um ensinamento precioso,
de um grande constitucionalista, professor Canotilho, de Portugal, que
sintetiza bem a tese, defendida neste momento. Os direitos fundamentais podem
ser restringidos, todavia, somente e apenas quando for indispensável e no
mínimo necessário; essa é a fórmula que devemos buscar: sempre no mínimo e no
indispensável, para alcançarmos o objetivo de salvaguardar outros direitos e
interesses constitucionalmente protegidos.
No fundo, a problemática da restrição dos
direitos fundamentais supõe sempre um conflito positivo de normas constitucionais.
O que é um conflito positivo? significa existência de normas constitucionais de
direito presentes no mesmo cenário conflituoso. Os estudiosos do direito se
lembram da questão da “competência para solução dos conflitos”. Como resolver
um conflito positivo? A saber, entre uma norma consagradora de certo direito
fundamental e outra norma consagradora de outro direito, de diferente interesse
constitucional, mais uma vez a regra de solução é a “máxima observância dos
direitos fundamentais envolvidos e sua mínima restrição compatível com essa
salvaguarda adequada do outro direito fundamental ou interesse fundamental em
causa”.
Já partimos para as considerações finais. Reitero:
tratamos hoje do maior desafio de uma polícia voltada à defesa do cidadão, e esse
é nosso compromisso institucional, sendo a Polícia Militar compromissada com a
preservação da vida, da integridade física e da dignidade da pessoa humana. Somos
formados para esse fim.
Nossas Academias de Polícia e nossos Centros de
Formação não prevêm mais aulas de doutrina propriamente militar. Hoje a grade
curricular contempla conhecimentos humanísticos, com ênfase nos Direitos
Humanos, no Policiamento Comunitário, na gestão de polícia e nas técnicas de
policiamento. Eu sou de uma geração que ainda estudou, na Academia de Polícia
Militar do Barro Branco da década de 1980, entre várias matérias de cunho
profissional, também táticas de contraguerrilha, mas esse tempo está superado. Formamo-nos
já no início da vigência da Constituição Cidadã a qual defendemos, acima de
tudo, pelos seus preceitos. A minha turma se formou exatamente no ano de 1988.
De lá para cá a Polícia Militar evoluiu muito na sua formação, na preocupação
com as questões de justiça social e de sensibilidade do policial militar no
trato com as pessoas.
A
Polícia Militar incorporou o Policiamento Comunitário como filosofia e estratégia
de trabalho a partir da década de 1990 e, de modo institucional, vem defendendo
a preservação dos Direitos Humanos e, acima de tudo, a promoção desses direitos.
O policial, além de defensor, é o grande promotor, hoje, dos direitos humanos –
e faço referência aqui ao estudo de nosso companheiro presente, Coronel PM Marcos César Gritscher Leite,
que defendeu esse tema no Curso Superior de Polícia. O policial militar,
hoje, contemporâneo com sua formação, vem acompanhando as transformações e as
expectativas da sociedade brasileira, e é um grande promotor dos direitos
humanos. E é uma grande tarefa, uma difícil missão fazer com que alguns
direitos individuais cedam espaço ao interesse maior da sociedade e nós
buscamos, sim, o ideal de uma polícia humanizada. Defendemos a educação,
também, como um caminho seguro para mudanças, tanto na sociedade, quanto na
formação e na especialização policial.
A
novidade, senhores, é que a Polícia mudou e está mudando. Ela vem
constantemente se atualizando, acompanhando a dinâmica que marca o tempo
presente.
Então, encerrando nossa exposição, em respeito
a próxima fase, eu agradeço a audiência de todos e me coloco a disposição para
os debates.
Vou
resumi-las: As manifestações sociais violentas representam a revolta do povo
à política pública atual? Eu creio que será possível relacionar as três,
para respondermos em
conjunto. A segunda é: Qual o limite entre a quebra da
ordem pública e a manifestação social? E a terceira: O que acha de
membros de partidos políticos infiltrados nas manifestações e aprimorando
símbolos como o da anarquia?
Na condição de Tenente-Coronel comandei um
batalhão do interior, em Assis, o 32° Batalhão e, durante o ano de 2013,
acompanhei manifestações e pude organizar o policiamento preventivo nessa
cidade, assim como ocorreu em várias cidades da região, principalmente nas
sedes das nossas unidades, diante de manifestações populares que se iniciaram
em 13 de junho em São Paulo
e ganharam grande divulgação. Já no Policiamento Rodoviário pude, neste ano,
acompanhar duas manifestações, o que as pessoas talvez não conheçam, mas são as
chamadas “Marchas” ou “Caminhadas” em rodovias; já houve duas neste ano na
região oeste do Estado, da Frente Nacional de Luta Campo e Cidade (FNL),
antigos integrantes do Movimento Sem-Terra, reunindo mais de 500 pessoas na
rodovia. Imaginem o que isso representa para a segurança pública no aspecto da
segurança viária e também para aquelas próprias pessoas, a integridade física
deles e dos demais atores do trânsito nas rodovias. Portanto, pudemos
acompanhar e sentir a importância da presença do policiamento para evitar mal
maior.
Quando as manifestações partem para a
violência, a polícia age usando a força necessária para coibir excessos. Quando
há ruptura da ordem, a polícia deixa de atuar no caráter simples de dissuasão
pela presença, que é o acompanhamento, e passa a agir pela dissuasão com o uso
da força necessária (ou chamada contenção) para evitar um mal maior. Sempre na
fórmula “com o mínimo possível de intervenção”, resguardando o que for
possível, preservando, acima de tudo, a vida e a integridade física das
pessoas, a livre expressão do pensamento, da manifestação, desde que compatível
com a segurança comum. E quais seriam os limites da quebra da ordem das
manifestações sociais? É o que está previsto no ordenamento jurídico, como crime
e como contravenção penal, com atos irregulares graves. Aquilo que é crime o
legislador já previu, já estabeleceu como uma conduta grave. Portanto, a
intervenção deve ser imediata. Alguns pesquisadores chamam dissuasão pelo uso
da força, pelo sinônimo de contenção, mas o significado é o mesmo. É necessária
uma interdição pontual, com a retirada daquele cidadão e seu encaminhamento, e
aí surgem dificuldades, naturalmente: todos nós acompanhamos pelos noticiários
as dificuldades que o policiamento enfrenta para coibir excessos.
A fórmula está no planejamento operacional
inteligente, um planejamento que se antecipa às dificuldades. No nosso caso,
conseguimos contatos com as lideranças dos movimentos (recentemente, no Policiamento
Rodoviário), e conseguimos limitar o uso do espaço público, pois os
manifestantes queriam interditar toda a rodovia e conseguimos minimizar os
impactos com a conversa preliminar, com o planejamento conjunto; primeiro
tentamos demovê-los da tentativa de ocupação de qualquer via; depois,
mantendo-se a manifestação, minimizamos os impactos para a segurança viária.
Ainda atuamos, eventualmente, contra a ruptura da quebra da ordem, porque a
partir desse ponto se inicia, naturalmente, o ciclo da persecução criminal com
as responsabilizações devidas.
Finalizando, o que eu acho de membros de
partidos políticos infiltrados? A liberdade de expressão, liberdade de
manifestação existe para ser exercida por qualquer cidadão. De fato, há algo
errado quando em uma sociedade que não se manifesta. Eu gostaria que também
meus familiares, que meus filhos, que minha esposa, pudessem participar de
movimentos pacíficos e de manifestações ordeiras, sem quebra da ordem, e essas
manifestações somente são possíveis pela presença, hoje, da Polícia Militar
atuando preventivamente para a garantia desse próprio direito de manifestação.
Quanto a eventuais utilizações políticas e
infiltrações de pessoa - inclusive pagas com recursos, de que não se sabe a
origem e a procedência - para provocar desordem, a Polícia Militar não entra no
mérito do que motivou essas ações, mas procura minimizar os impactos e todos
sabemos que a democracia é um permanente exercício. A própria sociedade vai
julgando e fortalecendo o papel da polícia na medida em que acompanha os
esforços de aperfeiçoamento desse trabalho. Naturalmente que nós defendemos uma
manifestação isenta, uma manifestação sem cálculos de resultados, mas como uma
expressão de liberdade, como oportunidade das pessoas apresentarem suas
pretensões, seus inconformismos, buscando desse modo provocar o poder público e
a sociedade, de uma forma geral, sobre as transformações que todos desejam,
visando o bem comum.
Tenente-Coronel PM Adilson Luís Franco Nassaro
Currículo resumido: Comandante do 2º Batalhão de Polícia
Rodoviária de São Paulo. Formou-se na Academia de Polícia
Militar do Barro Branco em 1988. Bacharel em Direito, com Pós-graduação
em Processo Penal (Escola Paulista da Magistratura). Concluiu mestrado profissional (Curso
de Aperfeiçoamento de Oficiais) e o Doutorado (Curso Superior de Polícia) em
Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública no Centro de Altos Estudos de
Segurança de São Paulo (CAES). Concluiu também Mestrado em História
(pela UNESP). Realizou
cursos de especialização em: Policiamento de Trânsito Rodoviário e Trânsito
Urbano, Polícia Judiciária Militar, Policiamento Ambiental e Técnicas de Ensino. Autor de monografias e artigos
publicados sobre temas de interesse técnico-profissional como busca pessoal,
prisão em flagrante e policiamento preventivo. Integra Grupo de
Trabalho que desenvolve o “Manual de Direitos Humanos Aplicados à Atividade
Policial”, da Polícia Militar do Estado de São Paulo.