sábado, 6 de fevereiro de 2010

É a Força Pública!


Aplaudimos de pé a Proposta de Emenda Constitucional enviada em 03Fev10 à Assembléia Legislativa de São Paulo, com base em estudos do Estado-Maior da PMESP e que altera o nome da Instituição para “Força Pública do Estado de São Paulo”. E de fato, do seu famoso hino composto pelo poeta paulista Guilherme de Almeida, o trecho cantado com maior ímpeto em nossas comemorações sempre foi “(...) Seus passos deixam fundo na terra rastro e raízes, É a Força Pública!”.

É claro que nos afeiçoamos à expressão “Polícia Militar” que nos solidariza aos irmãos policiais-militares de outros Estados da Federação, mas justamente uma federação é a uma aliança de Estados diferentes que se unem para construírem uma grande nação. E a Constituição Federal do Brasil resguarda grande autonomia político-administrativa para seus Estados, incluindo mesmo o cultivo de símbolos próprios, como expressa seu artigo treze.

E o sentimento paulista merece e precisa de símbolos que lhe espelhem e representem especificamente a grandeza de São Paulo. Enganam-se os que pensam estreitamente e dizem que vamos desperdiçar tinta e adesivos e que estamos tratando de meras palavras ao vento, pois sabemos que os símbolos são capazes de inspirar, reunir e concentrar grandes esforços humanos.

De fato, sangue, suor e lágrimas só podem ter algum sentido se pagos por altíssimos valores humanos. Mas como não nos contentamos em saber quais são estes valores, precisamos traduzi-los para nossos olhos em imagens brilhantes e vibrá-los para nossos ouvidos em palavras insubstituíveis! Enganam-se os que pensam que as palavras são iguais. Elas se hierarquizam em graus diferentes em relação a nossa felicidade. Algumas valem latão outras valem ouro; algumas nos cortam com uma repentina tristeza, outras iluminam nossos olhos já nas primeiras sílabas que ouvimos.

Este é exatamente o caso da expressão Força Pública. Quando a ouvimos vibrada, uma multidão de significados elevados como se materializam! Lembramos de imediato que é a tradução direta e fiel da Force Publique prevista pelo artigo 12 da “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão” feita pela Assembléia Constituinte francesa de 1789. Lembramos que esta Declaração é a mãe de todas as atuais democracias do mundo e que fez renascer no século XVIII a igualdade de direitos inventada e defendida com armas pelos cidadãos de Atenas e duramente conquistada pela República Romana. Lembramos que com a Force Publique nos livramos das guarnições dos reis que encarceravam sem julgamento; que com a Force Publique a polícia passou a ser constituída pelo povo e para servir ao povo.

Quando ouvimos Força Pública! ecoa ainda em nossos ouvidos outra palavra importante e que dá garantias aos nossos direitos e tornam doces nossos deveres: a palavra República! Palavra cujo real significado participativo vem sendo conquistado lentamente no nosso jovem Brasil desde 1889. Palavra que diz respeito a um número crescente de irmãos brasileiros que, com melhor ensino, são incluídos e podem integrar responsavelmente a vida política de seu país. República que tem sua alma na Constituição. Pois é nas suas cláusulas pétreas e em cada uma de suas linhas preciosas que temos a garantia de continuidade da paz, da confiança e do desenvolvimento do país que queremos para nós e nossos descendentes.

E não nos escapa que foi em defesa desta Constituição que em um Nove de Julho o povo de São Paulo e sua Força Pública se levantaram e pegaram em armas em 1932. Esta é a maior data cívica para os paulistas. Não há lembrança de outra data que nos una tão fortemente.

Assim, quando ouvimos a expressão Força Pública, somos remetidos de imediato à Force Publique, à “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão”, à reconquista da Democracia, à nossa filiação ao melhor da Grécia e de Roma, à palavra República, à defesa da Constituição e ao seu máximo valor na garantia de nossos direitos e deveres que são o espelho mesmo de nossa dignidade pessoal. Corrente de associações que se torna cada vez mais visível quanto mais conhecemos e refletimos sobre a história de vida de nossos pais e mães, de seus antepassados, de nosso povo, a história do Estado de São Paulo.

De outro ponto de vista, vemos que ao mesmo tempo em que a globalização padroniza procedimentos para a produção e oferta de serviços, torna semelhantes as técnicas empregadas, universaliza as melhores práticas e conceitos, esta globalização está longe de tornar o mundo homogêneo e indistinto, como previam alguns sociólogos e historiadores. Em grandes federações como a União Européia e os Estados Unidos da América, já se observa que os homens guardam seu ambiente de origem como uma referência permanente e têm sede de identidade. O mundo da política multiplica acordos internacionais e amplia as responsabilidades das administrações locais. O mundo dos negócios já conhece o quanto a denominação de origem controlada agrega valor aos produtos. A internet depois de criar um igual e infinito espaço virtual precisa agora desesperadamente de conteúdos que só ambientes humanos diferentes e limitados criam. O futuro é também do particular, original e local. A identidade de São Paulo e sua gente será e terá cada vez mais valor neste novo mundo.

Então podemos nos congratular, pois a partir desta visão de futuro e daquele olhar para o passado se revela afinal perfeita a opção pelo nome Força Pública para a polícia ostensiva e preventiva que protege e serve a cidadã, o cidadão e seus filhos, em cada rua, estrada, praia, rio e floresta do Estado de São Paulo. Isto porque, afinal, temos algum controle sobre o presente e o futuro, mas não mudamos nosso passado. E naturalmente preferimos buscar no passado o que há de melhor para inspirar nosso futuro.

Autor: Sílvio Lúcio Franco Nassaro. Major da Policia Militar do Estado de São Paulo, graduado em Filosofia, Mestre e doutorando em Ética e Filosofia Política pela USP. Foi bolsista da Capes na França. É o atual Subcomandante do 24º BPM/I.