quarta-feira, 10 de agosto de 2011

UMA POSSÍVEL HARMONIZAÇÃO ENTRE ABORDAGEM POLICIAL E DIREITOS HUMANOS


1. ABORDAGEM POLICIAL COMO PROCEDIMENTO LEGÍTIMO E NECESSÁRIO
No Brasil, a Constituição Federal de 1988 foi fortemente influenciada pelos instrumentos internacionais de proteção aos direitos individuais, particularmente no seu art. 5o, em que se verificam garantias da inviolabilidade pessoal, impondo-se o devido respeito à intimidade, à vida privada e à integridade física e moral do indivíduo (incisos III, X e XLIX).
As Polícias Militares que por meio de seus agentes desenvolvem atividades ostensivas e ininterruptas voltadas à preservação da ordem pública (parágrafo 5º, do artigo 144, da Constituição Federal) têm procurado disseminar a imagem de uma “polícia de defesa do cidadão”, superando já a partir da década de 1990, o estigma de inflexível “polícia da segurança interna em defesa do Estado”. Defensoras das instituições públicas e da aplicação da lei elas sempre serão, mas o enfoque foi atualizado junto às rápidas mudanças sócio-culturais e políticas que o Brasil contemporâneo testemunhou. A implantação da chamada filosofia de “polícia comunitária” é um marco dessa nova polícia que se caracteriza por assumir a doutrina de aproximação e de trabalho junto com a comunidade beneficiária de seus serviços.
Todavia, no exercício de missões específicas devido à responsabilidade constitucional da Instituição, o policial militar pratica atos que naturalmente restringem liberdades individuais, na esfera administrativa de ação do poder público. Isso ocorre particularmente no caso da comum abordagem policial com busca pessoal, mediante o exercício do poder de polícia com requisitos e limitações próprias. Nesse sentido, convém lembrar o ensinamento de Álvaro Lazzarini: “O ato de polícia administrativa ou ato de polícia preventiva, como exteriorização do Poder de Polícia da Administração Pública, tem a mesma infra-estrutura de qualquer outro ato administrativo. Nele se encerra a manifestação do ‘Poder de Polícia’ e, assim, para ser válido, o ato de polícia deve partir de órgão competente, tendo em vista a realização do bem comum, observando a forma que lhe for peculiar e que poderá ser a escrita, verbal ou simbólica, tudo diante de uma situação de fato e de direito que diga respeito à atividade policiada, devendo, finalmente, ser lícito o seu objeto. Em outras palavras, como qualquer outro ato administrativo, o de polícia deve conter os requisitos da competência, finalidade, forma, motivo e objeto” (LAZZARINI, 1999:.205).
Compreende-se que a abordagem policial com a busca pessoal (e a veicular como seu desdobramento) constitui ato administrativo enquanto ato próprio de polícia. No campo da polícia preventiva é fundamentada na competência constitucional da Polícia Militar para iniciativas que garantam a preservação da ordem pública. Também o policial militar pode - e deve por questão lógica - realizá-la em face do autor de um delito, ou durante sua prisão em flagrante, no contexto da repressão imediata, nesse caso caracterizada como busca pessoal processual (NASSARO, 2004).
O procedimento é também fundamentado no art. 244 do Código de Processo Penal, sem mandado judicial, com a ação de iniciativa policial baseada em “fundada suspeita”, tratando-se de busca mediante seleção de quem será revistado. Nota-se que, nesse caso, a fundamentação é subsidiária, mantendo-se o procedimento na área administrativa de atuação policial desde que ainda não constatada a prática de infração penal por parte do revistado (quando então a busca terá caráter processual, a exemplo daquela realizada em cumprimento à ordem judicial - domiciliar ou pessoal).
A noção de limitação de direito, interesse ou liberdade é integrante exatamente do conceito de “poder de polícia”, apresentado na sua forma genérica, no art. 78 do Código Tributário Nacional, ainda como referência legal. E quanto ao modo de exercício, de acordo com Hely Lopes Meirelles, o ato de polícia possui três atributos básicos que o identifica: discricionariedade, auto-executoriedade e coercibilidade, ou seja, caracteriza-se pela livre escolha da oportunidade e da conveniência, além dos meios necessários à sua consecução, pela execução direta e imediata da decisão, sem necessidade de participação do Poder Judiciário, bem como, pela imposição de medidas de modo coativo (MEIRELLES, 1987: 130).
Em razão da versatilidade do emprego da abordagem policial, ela é considerada atualmente o principal procedimento operacional da Polícia Militar, trazendo resultados expressivos e contabilizáveis como prisões, apreensões de drogas e armas, recuperação de veículos e libertação de reféns de seqüestros relâmpagos. O número de abordagens policiais no ano de 2009 alcançou 11 milhões em todo o Estado de São Paulo e, com base nos indicadores operacionais, a cada 1.000 buscas pessoais foi possível: prender 10 criminosos; recuperar 6 veículos; apreender 2 armas de fogo; apreender 4 Kg de drogas. Esses dados foram divulgados em folheto produzido pelo setor de Comunicação Social da Polícia Militar de São Paulo, sob o título: “Obrigado por colaborar!” para campanha realizada sobre abordagem policial realizada em 2010, objetivando a conscientização da comunidade sobre a importância do procedimento policial.
Quanto à prisão de criminosos, que constitui importante resultado operacional para a redução ou controle dos índices criminais locais, já se conseguiu comprovar em trabalhos científicos que a maior parte das detenções realizadas pela Polícia Militar em determinado período deu-se como consequência direta de abordagens policiais bem sucedidas (NETO, 2009). Essa intervenção revela a iniciativa de policiais, que deve ser incentivada; mas, ao mesmo tempo, traz a preocupação do gestor de policiamento quanto a eventuais excessos praticados, que serão inevitavelmente objeto de reclamações por parte dos revistados e que trazem desnecessários desgastes.

2. A TRANSPARÊNCIA DIANTE DOS FOCOS DE TENSÃO
De fato, grande parte das reclamações recebidas no sistema de atendimento ao usuário dos serviços da Polícia Militar de São Paulo, o “Fale Conosco”, se refere a condutas de policiais militares em abordagens. Todavia, constatou-se em entrevista com o Oficial responsável pela administração desse serviço, em 2010, que “o cidadão normalmente não reclama de ter sido submetido à abordagem policial, mas da forma como foi tratado”.
Superado eventual questionamento sobre aspectos de legalidade e de legitimidade do procedimento, há que existir um empenho conjunto voltado à sensibilização da comunidade quanto à necessidade dessa intervenção, associado a um trabalho interno (focado nos agentes policiais) para aperfeiçoar o relacionamento interpessoal no momento difícil caracterizado como “hora da verdade”, o grande teste da qualidade do serviço policial desenvolvido em área precipuamente preventiva de ação (MORAES, 2000). Por conta dessas conclusões, a Polícia Militar em São Paulo vem desenvolvendo desde 2010, em parceria com o Instituto “Sou da Paz”, o programa “Abordagem Legal - Polícia e Comunidade Juntos pela Segurança”, promovendo ações de conscientização após elaboração de diagnóstico e plano de ação, com divulgação na Internet (disponível em: http://abordagempm.blogspot.com/ ).
Nota-se que o Procedimento Operacional Padrão (POP) de abordagem policial trouxe inegáveis avanços, no contexto do Programa de Qualidade da Polícia Militar paulista (no campo regulamentar a abordagem policial relaciona-se com os Processos: 1.01.00 - abordagem de pessoas a pé; 1.02.00 - abordagem de veículos; 1.05.00 - vistoria de veículo; e 5.03.00 - uso de algemas). A adoção de procedimentos padronizados para as atividades operacionais é exatamente uma das características da Gestão da Qualidade, de modo a garantir o controle dos processos de produção e, também, de forma a estruturar um sistema de supervisão que se encarregue de divulgar e ensinar os padrões aos agentes operacionais, assegurando o seu cumprimento. Inclusive, a partir do ano 2000, os Planos Plurianuais da Polícia Militar passaram a contemplar a padronização de procedimentos como estratégia institucional, na exposição dos seus “Objetivos Organizacionais”. A sequência de ações previsíveis que caracterizam um procedimento, com rigor técnico e institucionalmente padronizada, trouxe maior segurança ao agente policial.
Todavia, o POP não é suficiente para propor fórmula de comportamento nas inúmeras variáveis da abordagem policial, notadamente quando existe alguma resistência por parte do sujeito passivo da busca: esse é o fator humano. E nem mesmo seria possível prever todos os desdobramentos de uma intervenção policial. Portanto, à exigência de conhecimentos técnico-policiais, deve somar-se a imprescindível consciência da fundamentação legal do procedimento que impõe natural restrição de direitos individuais - no universo dos direitos humanos - em prol do bem coletivo; a esse conhecimento teórico e doutrinário, também deve se somar a sensibilidade advinda da consciência da importância dos direitos individuais e o papel exercido pela Polícia Militar como “protetora e promotora dos direitos humanos”.
Apesar dos avanços alcançados, constatam-se indesejadas incidências de não-conformidades que indicam prejuízos desnecessários aos direitos individuais dos sujeitos passivos das abordagens policiais. Nessa linha, surgem denúncias e registros de imagens divulgadas de abusos praticados por policiais durante abordagens, facilitados pela popularização dos dispositivos portáteis e digitais de filmagem, inclusive em aparelhos celulares, o que revela a amplitude de uma questão que não é nova no meio policial, mas urgente em face da relação direta com o estratégico procedimento da abordagem policial.
Lidar com esses focos de tensão de forma transparente e buscar o continuo aperfeiçoamento do trabalho policial deve ser uma preocupação constante do gestor responsável em cada nível de administração da Polícia Militar. Para tanto, a confiança conquistada diante do sucesso do policiamento preventivo é fundamental em função do consequente apoio da comunidade para continuidade das intervenções policiais - a cada dia aperfeiçoadas - que objetivam acima de tudo o bem estar social.

4. JUSTIFICATIVA DA TESE DA HARMONIZAÇÃO
Mesmo considerando que as garantias individuais representam também limitação ao poder do Estado, que é fundamento histórico das Constituições, pode-se concluir que não são elas (as garantias individuais) absolutas quando se trata da realização da busca pessoal e de outros procedimentos imprescindíveis para a ordem pública e o bem-estar social, previstos em lei. Deve ocorrer, naturalmente, que alguns direitos individuais cedam espaço ao interesse maior da sociedade, no limite do que seja necessário e razoável à realização do bem comum.
Trata-se, na verdade, de equilibrar e garantir direitos individuais de mesmo nível e dignidade constitucional, no caso, aqueles relacionados à “inviolabilidade pessoal” e a segurança devida a todo cidadão (caput do art. 5º, da CF). É este o sentido do artigo XXVIII, da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, de 1948, quando estabelece que: “Os direitos do homem estão limitados pelos direitos do próximo, pela segurança de todos e pelas justas exigências do bem-estar geral e do desenvolvimento democrático” (IX CONFERÊNCIA INTERNACIONAL AMERICANA, 1948).
Por outro lado, a Polícia Militar está compromissada em prestar serviços públicos de qualidade, buscando constantemente apresentar um trabalho de maior eficiência, visando satisfazer os anseios da comunidade. Para esse mister, deve pautar-se por praticar as melhores técnicas operacionais, com o respeito aos direitos humanos, para aumenta a confiança em suas intervenções. Por esse motivo, definiu como um dos Objetivos Institucionais a “preocupação constante com a imagem institucional para que aumente cada vez mais a credibilidade da Instituição e consequente impacto na sensação de segurança da população”, nos temos do seu Planejamento Estratégico (PE) 2008-2011, p.17.
Não obstante o amparo jurídico defendido em relação à abordagem policial, ocorre que o desrespeito aos direitos humanos por desvios de conduta de integrantes da Polícia Militar, por culpa ou dolo, traz como consequência a desconsideração, por parte da mídia e dos organismos de direitos humanos, dos relevantes serviços prestados diuturnamente pela Instituição na defesa da pessoa humana. As criticas aumentam quando carregadas de conotação política e já foram verificadas inclusive movimentações de algumas comunidades que lançaram cartilhas com distribuição aos cidadãos contendo alertas “sobre os seus direitos” no caso de abordagens policiais, orientando sobre as possíveis reclamações contra a polícia.
Ocorrências com desfechos negativos e relacionadas a abordagens policiais geram impacto na opinião pública e são vigorosamente exploradas pela imprensa cada vez mais ágil em função da mesma tecnologia que permite a divulgação instantânea de informações e imagens, inclusive em movimento. Relevante, por esse motivo, a redução de não-conformidades para o aprimoramento do serviço policial-militar, partindo-se da harmonização com a filosofia de direitos humanos aplicada à abordagem policial, em conjunto com medidas corretivas.
De fato, a Instituição definiu como visão de futuro uma meta auspiciosa que passa necessariamente pela abordagem policial, em função dos valores que a norteiam: “A Polícia Militar do Estado de São Paulo consolidará sua condição de referência nacional na gestão de segurança pública, satisfazendo os anseios e necessidades da sociedade, transmitindo sempre sensação de segurança aos seus cidadãos, sendo reconhecida pela legalidade, competência, atualidade, flexibilidade e humanitarismo” (PE 2008-2011).
O maior desafio de uma Polícia moderna, voltada à defesa do cidadão e por isso orientada pelo constitucional e fundamental “princípio da dignidade da pessoa humana”, é o equilíbrio do seu principal instrumento de atuação preventiva, a abordagem policial, com a defesa dos direitos humanos. Sem defender procedimento diferenciado para sujeitos passivos que integram minorias, por questão de igualdade de tratamento que se deve a todos dispensar, defende-se de modo geral a imposição mínima de restrição de direitos individuais, sob os critérios da razoabilidade e da necessidade da intervenção policial.

5. AMPLITUDE DO COMPROMISSO INSTITUCIONAL
Em São Paulo, a preconizada harmonização é confirmada pelos termos do parágrafo único, do art. 1º, da Lei Estadual 13.123, de 08 de julho de 2008, que se trata do Plano Plurianual para o quadriênio 2008-2011, do Governo de São Paulo, ao estipular que “a garantia da segurança pública e a promoção dos direitos humanos” é uma das três diretrizes fundamentais de toda a Administração Pública Estadual e dos programas estabelecidos no mesmo plano. Nesse raciocínio, a segurança pública não exclui a promoção dos direitos humanos, mas complementa-o. Infere-se, conclusivamente, que as duas condições da citada diretriz estão associadas, pois uma não pode existir por completo sem a outra.
A legislação infraconstitucional e os regulamentos do trabalho policial estão necessariamente alinhados às disposições da Constituição Federal (CF). Note-se que o princípio da “dignidade da pessoa humana” é um fundamento da própria existência do Estado brasileiro - como República Federativa - nos termos do inciso III, do artigo 1º da CF.
A questão da promoção dos direitos humanos em face da segurança pública foi objeto de ampla discussão na 1ª Conferência Nacional de Segurança Pública, cuja etapa nacional ocorreu de 27 a 30 de agosto de 2009 em Brasília/DF, tendo por um dos seus objetivos o fortalecimento dos eixos de valorização profissional e de garantia de direitos humanos como pontos estratégicos para a política nacional de segurança pública, com foco na prevenção. Conforme divulgado no texto-base que norteou o encontro, assim se descreveu: “[...] Contudo, nos últimos anos o Brasil vem observando mudanças importantes. Na mesma medida em que hoje são inquestionáveis os progressos da democracia brasileira, é preciso creditar parte desses avanços às conquistas no campo da segurança pública. Não se trata apenas de uma revisão de valores ou estratégias, mas de uma verdadeira mudança cultural, que tem como premissa encerrar a dicotomia pouco produtiva (sobretudo, falsa) entre repressão e prevenção (também difundida como direitos humanos versus atuação policial) e reconhecer que a cada uma cabe vocação e lugar distintos, porém complementares e necessárias uma a outra” (1ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA, 2009).
Por fim, os direitos humanos, consagrados pelo arcabouço jurídico nacional e internacional, foram contextualizados no suporte doutrinário da Polícia Militar paulista, presente no Sistema de Gestão da Polícia Militar - GESPOL, que descreveu os principais processos envolvidos em suas ações gerenciais, posto que fundamentado na tríade: Polícia Comunitária, Gestão pela Qualidade e Direitos Humanos. (PMESP, 2010: 12). Dessa forma, na execução das diversas missões de polícia ostensiva e de preservação da ordem pública, cada policial militar deve agir estritamente dentro dos parâmetros ditados pela lei, sob os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, consciente de que é um profissional a serviço da sociedade e, como tal, deve atuar sempre de forma imparcial, evitando qualquer tipo de preconceito ou discriminação. Esses preceitos embasam o compromisso de atuação profissional que se registra em todos os documentos da Instituição, qual seja, o de que "Nós, Policiais Militares, sob a proteção de Deus, estamos compromissados com a Defesa da Vida, da Integridade Física e da Dignidade da Pessoa Humana". A concepção traduz a presença da Polícia Militar como Força da Comunidade de defesa da convivência humana, pacífica, ordeira e igualitária, como expressão histórica da verdadeira “Força Pública” em permanente evolução.
O suporte doutrinário da gestão da Polícia Militar demonstra a preocupação para com os direitos humanos (PMESP, 2010: 14), alinhando-se com as diretivas da Declaração Universal dos Direitos Humanos definidas na seguinte assertiva: “o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta Declaração, se esforcem, através do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universal e efetiva, tanto entre os povos dos próprios Estados-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição” (TRINDADE, 2000: 80).
Por esses fundamentos legais e regulamentares, a Polícia Militar não compactua com qualquer manifestação ou tentativa de discriminação às pessoas e adota o Manual dos Direitos Humanos e Direito Internacional Humanitário para Forças Policiais e de Segurança, preconizado pela Organização das Nações Unidas (ONU), com distribuição e treinamento voltados a todo o efetivo policial-militar (ROVER, 2008). Defende-se que os excessos eventualmente praticados em nada contribuem para o resultado operacional desejado e, ainda, provocam desgastes em face de reclamação do abordado; em outras palavras, que a mínima restrição de direitos durante a abordagem, realizada com critérios técnicos e tratamento igualitário, viabiliza os efeitos esperados e inibe manifestações contrárias à intervenção policial.

6. CONCLUSÕES
Deve-se considerar possível o ideal de uma harmonização entre abordagem policial e a filosofia de direitos humanos a permear todos os programas de policiamento, diante do compromisso de defesa da vida, da integridade física e da dignidade da pessoa humana. Parte-se da noção de que, paradoxalmente, quando se realiza uma abordagem policial para preservação da ordem pública e, em última instância para garantia dos próprios direitos humanos (somente possível com segurança pública), impõe-se uma natural e inerente restrição de direitos individuais, legitimada no exercício do poder de polícia. Essa ação será considerada equilibrada pela mínima imposição de restrição de direitos individuais, observados os critérios da razoabilidade e da necessidade do ato, diante do caso concreto.
A realização do procedimento de modo uniforme e igualitário, por parte dos policiais militares, com técnica, qualidade e sem qualquer discriminação - como preconizam a legislação, as normas internas e a própria doutrina institucional - não impede o alcance dos resultados operacionais desejados; ou seja, com o máximo respeito possível aos direitos individuais do revistado, o objetivo da intervenção policial será alcançado.
A formação e os mecanismos de instrução continuada devem ser capazes de qualificar o policial militar como um agente consciente do nível de responsabilidade nele depositada na condição de “protetor dos direitos humanos”, não obstante o aparente conflito entre restrição e proteção de direitos incidente na ação policial. Nessa situação, o agente se apresentará seguro da fundamentação legal dos seus atos em prol do bem comum e, ainda, sensível quanto à importância da máxima preservação dos direitos individuais em compatibilização com a intervenção policial restritiva.
Sem prejuízo da formação e da instrução, os gestores da Polícia Militar devem permanentemente monitorar as manifestações de desvios de comportamento, para atingir a redução de não-conformidades e, para esse fim, podem adotar novos métodos junto aos tradicionais mecanismos de depuração interna.
O momento é propício para reflexão sobre a chamada “humanização no atendimento”, preconizada com ênfase pelos órgãos de saúde de um modo geral, como uma marca de bons serviços prestados, sem perda de sua efetividade. O conceito deve ser adotado em todas as áreas de serviço público, especialmente aquelas de interface constante com o cidadão.
Em direção a excelência no trabalho policial, são convenientes medidas pontuais e localizadas, de iniciativa de cada gestor policial, para incorporação de conceitos e ensinamentos complementares ao procedimento padronizado vigente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFIAS

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Autor: Adilson Luís Franco Nassaro

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