quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

O transporte de objetos variados de contrabando e de descaminho em veículo automotor


O art. 334 do Código Penal, Decreto-Lei n.º 2.848/40, prevê o crime de contrabando ou descaminho nos seguintes termos: Importar ou exportar mercadoria proibida ou iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria. Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

Apesar de se encontrarem as duas condutas descritas conjuntamente no mesmo artigo, impondo-se a mesma pena, há diferença técnica entre o contrabando (a primeira) e de descaminho (a segunda), pois possuem elementos normativos diversos, como reconhece a doutrina, mesmo levando em conta que o uso da disjuntiva “ou” tornariam equivalentes as ações delituosas.
Diferenciando as modalidades, ensina Julio Fabbrini Mirabete:
"A primeira parte do art. 334, caput, refere-se ao contrabando, ou seja, à conduta de importar ou exportar mercadoria proibida. Importar significa trazer para o país e exportar é tirar dele qualquer mercadoria, pouco relevando se o faça através de alfândega ou fora dela. Nessa primeira modalidade é necessário que o objeto material seja mercadoria proibida, que inclui não só a que o é em si mesma (proibição absoluta), como a que o é apenas em determinadas circunstâncias (proibição relativa). (...) Na segunda parte do caput do art. 334, a lei refere-se ao descaminho, em que o crime se configura pela fraude empregada para evitar o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada ou saída de mercadoria não proibida (Manual de Direito Penal. 9. ed. São Paulo: Atlas, 1995, 3.v., p. 368)”.

Quanto aos sujeitos, importa notar que é comum a associação de várias pessoas para a sua prática, o que traz como consequência a caracterização do crime de formação de quadrilha ou bando, em concurso material com o respectivo delito do art. 334. De fato, o art. 288, do Código Penal prevê a conduta de: "Associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes. Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos".

Havendo participação de funcionário público na ação criminosa, este poderá responder pelo crime do art. 318, também do Código Penal, no caso de: "Facilitar, com infração de dever funcional, a prática de contrabando ou descaminho". Para essa hipótese, há previsão de pena de reclusão, de 03 (três) a 08 (oito) anos, e multa, como prevê o referido artigo.

A atuação policial tem reprimido o transporte de objetos de contrabando ou descaminho em veículos automotores, especialmente nas abordagens realizadas em bloqueios nas rodovias e acessos às áreas urbanas, destacando-se as apreensões de equipamentos de informática e eletro-eletrônicos em geral, além de cigarros e bebidas trazidos ilegalmente do exterior, especialmente do Paraguai. Destaca-se que, conforme Decreto-lei n.º 399/68, constitui contrabando a importação de fumo estrangeiro.

Quem transporta tais produtos, nessa condição, está sujeito à prisão e apreensão dos objetos transportados, em qualquer momento do seu deslocamento. A origem ilegal do material vincula o responsável ao contrabando (importar ou exportar mercadoria proibido) e a falta de documentos de importação, se não proibida a mercadoria, vinculam-no ao descaminho (iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria.

autor: Adilson Luís Franco Nassaro
Major PM Coordenador Operacional do 32º BPM/I, Assis/SP.
(reprodução autorizada, desde que citadas a fonte e a autoria)

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

O transporte ilícito de armas de fogo, acessórios e munições em veículos automotores


A Lei Federal nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, conhecida com “Lei do Desarmamento”, dispôs sobre registro, posse e comercialização de arma de fogo, acessório e munição, e também sobre o Sistema Nacional de Armas – Sinarm, definindo crimes correlatos.
Dentre as infrações penais previstas no Capítulo IV (Dos Crimes e das Penas), dos art. 12 a 21, três apresentam o verbo “transportar” junto às outras condutas relacionadas respectivamente em cada tipo, tratando-se de crimes de ação múltipla. São eles: art. 14, “porte ilegal de arma de fogo de uso permitido”; art. 16, “posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito” e art. 17, “comércio ilegal de arma de fogo”. Portanto, qualquer dessas infrações penais pode ser perpetrada mediante o uso de veículo automotor.
No caso do art. 14, o autor pode tanto “portar”, como “transportar” a arma de fogo, acessório ou munição de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, pois o que importa é exatamente a finalidade dessa conduta que, diversamente do propósito de comércio, limita-se à manutenção do objeto de ilícito em uma relação de proximidade.
Entende-se por acessório tudo o que pode acompanhar o objeto principal, que é a arma, para a realização do disparo, a exemplo de mira acoplável, silenciador, carregadores sobressalentes etc. Munição é o cartucho íntegro, que pode ser usado para alimentar arma de fogo.
O porte de arma é constatado normalmente nas buscas pessoais e corresponde à situação de se ter arma (acessório e munição da mesma forma) ao alcance das mãos, sem a necessidade de que ela se apresente ostensiva ou que seja exibida pelo portador. Aliás, quando portada, quase sempre a arma é ocultada, seja em razão de que se encontra em situação irregular com relação ao registro e/ou autorização de porte, seja porque não é conveniente à sua exibição em local público. Já o transporte, previsto também no caput do mesmo crime do art. 14 (“porte ilegal de arma de fogo de uso permitido”), corresponde à estrita locomoção do objeto de um local para outro e, também, depende de autorização, além do registro, evidentemente. No caso de transporte de arma, a conduta normalmente é detectada durante busca veicular que, tecnicamente, corresponde à extensão de uma busca pessoal.
Em termos práticos, se o objeto de ilícito (arma, acessório ou munição) estiver guardado em uma bolsa no bagageiro fechado de um veículo, inclusive de um ônibus, tem-se a conduta de transportar. Quando na cintura do condutor ou do passageiro, ou de outro modo junto ao seu corpo, ou em bagagem de mão ao seu alcance imediato, caracterizar-se-á o porte. Acentua-se que o texto legal tornou irrelevante a circunstância de a arma não se encontrar pronta para o uso durante o porte ou o transporte ilegal, ou seja, é indiferente se ela estava ou não municiada, alimentada e carregada.
A pena é de reclusão de dois a quatro anos, além de multa, e importa notar que, conforme parágrafo único, do art. 14, o crime é inafiançável, salvo quando a arma de fogo estiver registrada em nome do agente.
A mesma interpretação das condutas quanto ao porte e ao transporte é aplicada quando se trata de arma, acessório ou munição “de uso proibido ou restrito”, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, conforme art. 16, com pena maior, qual seja, reclusão de três a seis anos, e multa. Nessa mesma pena grave, incorre quem porta ou transporta arma de fogo com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado, seja a arma de uso proibido, restrito, ou não, conforme inciso IV do mesmo artigo.
No caso específico de ônibus rodoviário, que também são fiscalizados em abordagens policiais, nota-se que o porte ilegal de arma de fogo praticado por passageiros não é conduta incomum. O diário “Jornal de Assis” publicou matéria em 23 de abril de 2008, pág 11, noticiando a prisão de uma mulher por porte de arma, com o seguinte histórico: “Uma artista plástica de 67 anos de idade, que mora em Salvador, na Bahia, recebeu voz de prisão por policiais militares rodoviários de Assis e posteriormente foi levada à cadeia pública de Lútecia, ao ser flagrada na posse de uma pistola e duas caixas com munições, dentro de um ônibus que foi fiscalizado às 3h15 do último sábado, no km 445 da Rodovia Raposo Tavares. Embaixo do acento nº 15 do coletivo que transportava 11 passageiros, com itinerário Assunção (Paraguai) x Salvador (BA), os policias localizaram um pacote, no qual havia uma pistola marca Cobra, calibre 380, uma caixa com 43 cartuchos de calibre 380, marca CCI, outra com 50 munições de calibre 38, um coldre axial de cor preta e um carregador apropriado para a pistola. A passageira admitiu que o pacote lhe pertencia e recebeu voz de prisão. Tentou se justificar dizendo que um desconhecido pediu para fazer a entrega da arma em uma rodoviária, mas disse não saber quem seria esta pessoa. ‘Alguém iria chegar em mim e pegar o pacote. Eu fiz isso porque gosto de ajudar as pessoas; não sabia que estava cometendo uma ilegalidade’, alegou”.
Por outro lado, o transporte de mais de uma unidade, acessórios ou quantidade expressiva de munição, que em tese pode configurar o tráfico ilícito, ou melhor, “comércio ilegal” nos termos do art. 17 da mesma lei, depende da verificação da finalidade e constitui situação rara pelo histórico de apreensões recentes, o que significa que o transporte vem sendo realizado em maior escala por meios diversos do ônibus rodoviário, em que a dissimulação do material - que é compacto e pesado - seja viabilizada. Apesar de raros, existem registros de prisões de indivíduos por tráfico ilegal de armas, inclusive internacional, em ônibus rodoviário (normalmente de fretamento), como aconteceu recentemente em Araçatuba (01/09/08), de acordo com os seguintes termos do histórico da mensagem nº. 2BPRv-2121/241/08: “Durante fiscalização de combate ao narcotráfico e demais ilícitos penais, os integrantes da Equipe TOR abordaram o ônibus da Empresa São Luiz, Scania Marcopolo Paradiso, cor branca, ano 2008, placas HSI-0593 Três Lagoas/MS, que fazia o itinerário de Ponta Porã/MS à Araçatuba/SP, conduzido por Edigard Tadeu de Souza RG 29.661.868 SSP/SP, que transportava 07 (sete) passageiros e durante revista minuciosa, foi localizada, dentro de uma mochila de nylon de cor preta sob as pernas, ocultada por um cobertor, com o passageiro da poltrona 21, as mercadorias descritas no item 6 (01 Pistola Taurus 9 mm sem marca, modelo PT99 AF Parabellum; 02 carregadores de pistola 9mm, cap 15 cartuchos cada; 01 coldre de couro preto; 01 lançador de granadas sem marca e sem nº; 01 sub-metralhadora 9 mm sem marca de fabricação, Nore Americana; 02 carregadores de sub-metralhadora 9mm com capacidade para 40 cartuchos cada; 04 granadas M433 (40 mm); 13 granadas de mão M-09 A1, marca CEV; 03 granadas de mão marca DIM-ARGES; 02 granadas de mão modelo M14 marca CEV; 01 granada de mão modelo de procedência estrangeira FMR2MODO e 50 cartuchos marca aguila calibre .25). O indiciado alegou que adquiriu as mercadorias no Paraguai e seguia com destino à cidade do Rio de Janeiro/RJ para entregá-las à integrantes de uma facção criminosa no bairro da Penha. Diante dos fatos, foi dada voz de prisão em flagrante e encaminhado o infrator e mercadorias à Sede da Polícia Federal em Araçatuba/SP, onde foi lavrado o APFD por tráfico de armas internacional.”
Por fim, para o comércio ilegal (art. 17), a pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. No caso de tráfico internacional, a conduta é prevista no art. 18, com essa mesma pena, nos seguintes termos: “Importar, exportar, favorecer a entrada ou saída do território nacional, a qualquer título, de arma de fogo, acessório ou munição, sem autorização da autoridade competente”.

autor: Adilson Luís Franco Nassaro
Major PM Coordenador Operacional do 32º BPM/I, Assis/SP.
(reprodução autorizada, desde que citadas a fonte e a autoria)